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A cereja na arte

2009-06-17

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A cereja é, e será sempre, um motivo de inspiração para os artistas.
A cereja está, hoje, representada nos mais variados utensílios. Podemo-la encontrar em roupas, loiças, bijutaria, etc.… A razão para que tal aconteça é simples, trata-se de um fruto apelativo, apetecível e sedutor. Em suma é ela, afinal, a cereja em cima do bolo. Expressão banal que demonstra a importância da cereja, pequeno mas indispensável pormenor que, em detrimento da grande quantidade de massa doce que constitui o bolo, se assume como a jóia da coroa do reino da goludice.
Foram estas as mesmas razões para que, na iconografia cristã, a cereja fosse o símbolo do fruto da tentação. E se grande parte dos autores optou pela maçã para representar o fruto proibido, houve também quem tivesse escolhido a cereja.
Jerónimo Bosch, pintor flamengo, nascido em 1450, cujo espírito crítico e visionário o
colocara muito à frente do seu tempo, foi um dos que pintou a cereja com este significado. No seu tríptico o Jardim das delícias podemos encontrar, na parte central, uma galeria de gozos eróticos, onde entre várias figuras, surgem maçãs, morangos e claro está, cerejas.
Adepto da mesma temática, Antoine Baudoin pintou um rapaz que colhe cerejas, os frutos do seu desejo, e que as deposita no regaço de sua amada. O quadro tornou-se conhecido e Nicolas Ponce levou para a China uma gravura do tema, que fez figurar num prato chinês do período Kien Long. Neste prato, de cerâmica que em Portugal ficou conhecida por Companhia das Índias, a imagem foi orientalizada, mas o significado manteve-se.
Caravaggio, o grande mestre do barroco também pintou cerejas. Fê-las figurar no quadro a que chamou o "menino mordido pelo lagarto". Neste quadro encontramos uma interessante expressão de dor e espanto, no rosto de um jovem, que é mordido, num dedo da mão, por um lagarto. O lagarto simboliza o conhecimento, a cereja a tentação, assim a dor e o espanto são resultado da aventura que cada criança experimenta ao deixar-se tentar pelas novidades que a rodeiam.
Depois de Caravaggio, vários pintores holandeses fizeram figurar as cerejas nas suas naturezas mortas. Foi porém Chardin, o grande mestre francês, que as representou duma forma especial. Nunca as misturou no cesto de fruta, pintou-as em evidente simbolismo sobre a mesa, numa clara atitude provocatória.
Henri Fantin-Latour, pintor do século XIX, que segue a tradição holandesa, pintou igualmente cerejas. Tal como Chardin dedicou-lhe o mesmo lugar na tela. Ficou célebre o seu quadro noivado onde todos os elementos surgem carregados de simbolismo. A taça de morangos ligada à sedução, o bouquet à reprodução, a rosa branca à virgindade e as cerejas símbolo da tentação e da paixão.
Manet, contemporâneo de Fatin-Latour, considerado por muitos como o pai do impressionismo, foi também um classicista. Estudou Velásquez, Rembrandt e Chardin e um dos seus primeiros trabalhos, o rapaz das cerejas demonstra a influência dos velhos mestres. Neste quadro vemos um rapaz feliz e seduzido por um punhado de cerejas. Do mesmo autor é o Almoço Campestre, a pincelada rápida e empastada anuncia um novo estilo, mas a natureza morta no canto inferior esquerdo demonstra a influência de Chardin e, aí, surgem em primeiro plano as cerejas.
Não referirei mais autores para não tornar demasiado extenso este texto, contudo, não poderia terminar sem falar nas louças das Caldas que, entre motivos animais e vegetais, escolheram muitas vezes a cereja para figurar em jarros e copos. As cores e as formas mostram-nos variedades de cereja hoje desaparecidas. A composição conjugando frutos, anfíbios e répteis, remete-nos para a cerâmica seiscentista de Bernard Palissy.
A cereja é, e será sempre, um motivo de inspiração para os artistas., haja por isso quem saiba dar continuidade a uma outra arte, a de bem produzir cerejas.



Autor
Carlos Madaleno

Categoria
Opinião

Palavras-Chave
cereja / cerejas / Chardin / quadro / pintou / figurar / fruto / tentação / lagarto / demonstra

Entidades
Jerónimo Bosch / Antoine Baudoin / Nicolas Ponce / Caravaggio / Chardin

Artigo Preservado pelo Arquivo.pt
→ Ver Original

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