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Nunca é tarde para aprender

2010-09-15

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São 12 as idosas que aprendem a ler e escrever no Espaço das Idades.

A maior conquista sentida por Maria Amélia Cavaca nos últimos anos foi quando, chegada ao fundo de uma rua, olhou para a placa com o nome, conseguiu juntar as letras e perceber onde estava, sem ter de perguntar a ninguém, como foi habitual durante toda a vida. O entusiasmo foi tanto que contou à professora assim que voltou a entrar na sala da escola para adultos do Espaço das Idades, a funcionar duas vezes por semana.

O empenho de Maria Alice, de 72 anos, torna-se evidente a quem assiste a uma das aulas. A motivação vem da frustração sentida ao longo de uma vida inteira por não saber ler nem escrever. "Sentia-me tão mal a pôr o dedo", conta, a propósito das ocasiões em que, nos documentos oficiais, em vez da assinatura tinha de recorrer à impressão digital.

"Sempre quis aprender, mas a vida não me deixou", lamenta Maria Amélia. Em criança, a escola nunca passou de uma miragem. Aliás, nem sabia a localização de nenhuma, já que na altura existiam poucas. Criada na Quinta da Várzea, arredores da Covilhã, via o filho dos terrenos à volta sair todos os dias para as aulas, no carro conduzido pelo motorista do pai. A escola era, do seu prisma, coisa de ricos. Para alguém que ficou sem pai quando completou um ano, com seis irmãos entregues a uma mãe sem recursos, os livros não passavam de um sonho.

"Tinha desgosto por não saber ler"
Quem a vê chegar tão entusiasmada à sala de aula, quase 70 anos depois, a trocar os óculos, tirar o caderno de duas linhas e começar a soletrar palavras, já com bastante ligeireza, tem dificuldade em assimilar que há menos de um ano não conhecia sequer uma letra. Era ainda uma criança, de oito anos, já estava a servir. "Como não sabia fazer mais nada punham-me a retalhar farrapos para mantas". Mais tarde tornou-se criada de servir na casa de um a família abastada. "Quando construíram o Bairro do Rodrigo e a escola, eu já era uma mulherzinha", recorda, após uma vida em que diz ter passado muito. "Com o passar dos anos mais desgosto tinha por não saber ler", diz.

Num convívio a que veio no Espaço das Idades, soube que em Novembro ia começar a funcionar o ensino para adultos. A vergonha era muita, mas a vontade e o desejo antigo de sair do analfabetismo fizeram-na "dar o nome". "Nos primeiros dois ou três dias sentava-me ali de costas, envergonhada. Já viu? Quem visse aqui agora esta velha na escola! Mas eu de nova não pude. Comecei a vir e encontrei uma família", sublinha Maria Amélia Cavaca, que explica porque se sente a progredir: "Eu levei isto a sério". A professora, Ana Rei, de 28 anos, confirma o empenho e determinação.

"Faço tudo por tudo para não faltar"
"Senhora professora, não pude fazer os trabalhos de casa", avisa, assim que chega, ofegante, vinda de uma consulta no Centro de Saúde. "Vim a correr para apanhar o autocarro, nem o meu cafezinho tomei". O marido ficou a almoçar, ela limitou-se a engolir uma sopa, para poder chegar a tempo. "Faço tudo por tudo para não faltar", salienta. O objectivo de Maria Alice é aprender o mais possível, de forma a daqui a uns tempos conseguir ler o jornal sem dificuldades, embora esteja sempre a lembrar as suas limitações. "Com a minha idade sei que já não vou aprender muito. A nossa cabeça já não atinge certas coisas", realça. "Mas aí a nossa princesa vai-me deixar esperta", acrescenta, a rir, referindo-se à professora.

Ana Rei, licenciada em Ciências da Educação que faz este trabalho voluntariamente, elogia a evolução das alunas. Maria Amélia é o seu caso de maior sucesso. "Ela lê e sabe o que está a ler, consegue perceber", diz, já depois da covilhanense de 72 anos ter saído da aula, para ir ao Teixoso regar. Segundo a professora, o nível atingido deve-se ao interesse. No caso de Maria Amélia, faz normalmente trabalhos de casa, para não se esquecer do que aprende, e é bastante assídua. Mas nem toda a gente pode vir sempre. Os filhos e netos são a prioridade, e por vezes, para ficarem com eles, nem sempre aparecem.

Agosto foi mês de férias. A escola encerrou. Até porque muitas das alunas não podiam vir, uma vez que ficaram com os netos em casa, enquanto os colégios estão fechados ou as aulas não começam. A visita dos filhos ou outras actividades são motivo para deixar as letras em suspenso.
(Reportagem completa na edição papel)



Autor
Ana Ribeiro Rodrigues

Categoria
Secções Centrais

Palavras-Chave
Maria / Espaço / Amélia / escola / ler / vida / professora / Idades / aprender / casa

Entidades
Maria Amélia Cavaca / Maria Alice / Maria Amélia / Ana Rei / Espaço das Idades

Artigo Preservado pelo Arquivo.pt
→ Ver Original

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