Se calhar temos de pôr os olhos nas pessoas com esclerose múltipla, com doenças crónicas e deficiências físicas ou psíquicas, que apesar do pouco apoio que têm das instituições, se conseguem organizar, lutar pelo seu direito a viver com qualidade.
No dia 27 de Junho celebra-se o Dia Mundial da Esclerose Múltipla. A Esclerose Múltipla é uma doença crónica do sistema nervoso central que afecta sobretudo pessoas jovens, que não tem cura e que resulta de um ataque organizado pelo próprio organismo a uma camada de protecção que os nervos têm e que se chama mielina. A destruição dessa camada resulta na lentificação da passagem do impulso nervoso - o sistema nervoso funciona como um sistema eléctrico – e, no caso desta doença, como um sistema eléctrico sem isolamento.
Um amigo meu costuma dizer que é muito mais fácil mandar matar 600 pessoas do que matar o senhor Silva. A diferença está em que 600 pessoas são um número, o senhor Silva é uma pessoa, tem família, pais dependentes, um filho pequeno. Posso dizer que cerca de cinco mil pessoas têm a doença em Portugal - e isto é um número frio, mas também posso dizer que conheço várias pessoas – a senhora M, a menina F, o senhor J - que têm esta doença e que acompanho de perto a luta diária que têm para continuar a viver com toda a dignidade. E tenho muito orgulho em conhecê-los, porque a grande maioria, após o choque inicial que foi descobrir que tinha uma doença crónica e progressiva, levantou-se e foi à luta. A grande maioria continua a fazer a sua vida normal, sem sobressaltos, mantém o emprego, não falta e raramente mete baixa. Há quem esteja a trabalhar e no fim do turno venha ao hospital fazer os tratamentos na fase aguda da doença, apesar do enorme cansaço. A grande maioria não baixou os braços e, independentemente da evolução da doença, não se deixou vencer por ela.
E não dá para perceber como é que um País constituído por pessoas que considero pequenos heróis (e não falo só dos doentes de esclerose múltipla, mas de todos os portadores de doenças crónicas ou de algum tipo de deficiências que lutam e se esforçam para vencer os obstáculos criados pelo seu corpo), como é que um País com esta gente se deixa afundar numa crise de alma que ultrapassa em muito a crise económica, e que já anda por aqui há muito tempo…Agora fala-se no efeito positivo da crise, vamos sair desta com imensas ideias e cheios de inovação. Afinal só temos cerca de nove por cento de desempregados, comparados com Espanha estamos óptimos - mas eu só consigo pensar no senhor João e na dona Maria, que trabalhavam na mesma fábrica, têm três filhos e o fim do subsídio de desemprego em Setembro.
Independentemente de sermos inovadores ou não, se calhar temos de pôr os olhos nas pessoas com esclerose múltipla, com doenças crónicas e deficiências físicas ou psíquicas, que apesar do pouco apoio que têm das instituições, se conseguem organizar, lutar pelo seu direito a viver com qualidade no Pais onde nasceram e continuam a trabalhar para dignificar esse mesmo País, apesar, e repito, do pouco apoio das instituições que dirigem o mesmo Pais. E eu sei a dificuldade que há em manter um doente no Interior a fazer fisioterapia o ano todo, a dificuldade em colocar doentes em lares – onde ficam no meio de pessoas com idade para serem avós deles - e a dificuldade que o hospital sente em financiar a medicação destes doentes. Falou-se numa rede de cuidados continuados para doentes de esclerose múltipla - perguntei recentemente a um colega que foi a todas as reuniões na Direcção Geral de Saúde e parece que o projecto ficou no papel. Vamos esperar que ressuscite para as eleições.
Autor
Assunção Vaz Patto
Categoria
Opinião
Palavras-Chave
pessoas / doença / esclerose / múltipla / Junho / Mundial / doenças / senhor / apesar / nervoso
Entidades
senhor Silva / João / Maria / Pais / Direcção Geral de Saúde
Artigo Preservado pelo Arquivo.pt
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