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Como se arma uma zaragata

2010-09-29

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Por tudo e por nada somos capazes de armar uma bernarda que nunca se sabe como poderá terminar.
Todos os dias somos confrontados com notícias de acontecimentos e perturbações sociais. Se os meios televisivos deles fazem eco com observações de diferentes ângulos e perspectivas, os registos escritos também não lhes ficam atrás e, por vezes, fazem-no de tal modo que dá impressão que nada de bom se vai passando no dia a dia das vidas. Vejam se é ou não verdade o que acabo de dizer ao transcrever apenas alguns dos cabeçalhos inscritos num diário que me habituei a comprar regularmente: "Inspector do Trabalho ataca hipermercados; Grávida agredida com ácido por ex-namorado; Apreendidas duas toneladas de haxixe; Álcool a mais estragou a noite; PSP trava tráfico de droga em discoteca; Onze detidos em operação stop; Ourivesaria esvaziada em minutos; Combate a aceleras na Avenida Europa; Insultos marcam protestos contra canil ilegal; Camião esmagou perna de mulher; Tio e sobrinho morrem a limpar poço; Apanhado a guiar carroça bêbado; Incêndio lavrou em zona de eucalipto…"

Fiquemo-nos por aqui porque as desgraças parecem não ter fim e não vale a pena sequer entrarmos nos cabeçalhos da politiquice porque aí também teríamos matéria quanto baste. Por tudo e por nada somos capazes de armar uma bernarda que nunca se sabe como poderá terminar. Foi o que aconteceu um dia destes, em pleno centro da cidade, onde um jovem e um senhor bem-posto, na casa dos setenta, desconhecidos, se cruzaram no passeio e se tocaram, ao que julgo inadvertidamente. Um deles começou então por resmungar pelo facto de o outro lhe ter tocado quando passava. Este respondia da mesma forma, dizendo que ele é que tinha sido tocado quando seguia no passeio. Só sei que num abrir e fechar de olhos a coisa se azedou de tal forma que começaram a desferir biqueiradas, empurrões, murros, tendo o mais velho puxado do cinto para atacar e se defender também. Foram minutos bem disputados até que uns óculos foram parar debaixo do carro estacionado ao lado, uma carteira a tiracolo foi disparada para o outro lado da rua e o mais velho caiu estatelando-se contra a parede onde esmurrou o nariz e a testa enquanto recebia joelhadas e pisadelas com palavrões à mistura. Isto em plena tarde de sol, a dois passos de uma instituição bancária do centro da cidade onde o movimento é constante.

Um observador que saía da dita instituição ainda presenciou o caso e tentou serenar os ânimos e arrumar a casa, mas foram-lhe oferecidos também meia-dúzia de empurrões. O combate não deve ter demorado mais de cinco minutos. Os ânimos entretanto serenaram, seguindo depois cada qual o seu caminho, como se nada tivesse acontecido. Por acaso não estava à mão qualquer câmara de filmar nem a caneta do jornalista se encontrava por perto. Apesar de tudo a notícia cá está, acrescentando, de certo modo, o rol das tais desgraças que parecem não ter fim, deixando-se de parte o bom que a vida tem e o bom que o relacionamento social comporta e que também deverá ser tema de letra gorda na imprensa diária que nos entra pelos olhos, nos alimenta e, aos poucos, quase sem darmos por isso, é bem capaz de nos ir modelando.



Autor
sérgio gaspar saraiva

Categoria
Opinião

Palavras-Chave
sociais / capazes / armar / bernarda / poderá / minutos / terminar / arma / zaragata / confrontados

Entidades
Apreendidas / Tio / Apanhado / Insultos / PSP

Artigo Preservado pelo Arquivo.pt
→ Ver Original

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