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Os limites da realidade

2012-11-21

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Ultrapassamos os limites da realidade e entramos no domínio do pesadelo social.

" Qualquer programa de ajustamento aplicado a uma economia que apresenta flagrantes desequilíbrios provoca sempre dor, mas, no caso presente, o Conselho Económico e Social tem razões para temer que possa haver dor sem ajustamento." Quando no Parecer sobre a proposta de Orçamento do Estado para 2013 é feita esta afirmação, importa reflectir sobre as consequências imaginadas pelos membros do CES, representantes de empregadores, de trabalhadores, e por um homem que foi ministro do actual Presidente da República, Dr. Silva Peneda. É que estamos perante um órgão de consulta e concertação, de nível constitucional.
Esclareça-se que nesse Parecer se reconhece que o país chegou a este estado por um processo que foi "acumulando desequilíbrios macroeconómicos e debilidades estruturais que, no contexto da crise internacional que se vive, conduziram ao avolumar do endividamento (público e privado) e a níveis elevados de endividamento externo". Tratou-se de um processo da responsabilidade de vários Governos, das empresas, das famílias, da banca, do euro… ou dos mecanismos que conduziram à sua instituição… sem referendo…lembram-se?
Diga-se que o CES afirma que o processo de consolidação orçamental passará por uma profunda reforma do Estado e da Administração Pública, sem a qual será impossível reequilibrar de forma sustentável as finanças públicas, reforma sabida há muito, mas que por influência de lóbis vai se adiando. Lembremos que o nosso país conhece o retorno da emigração, a qual, porém, é diferente da observada no passado, por ter uma forte componente de jovens, com elevadas habilitações, nos quais o país investiu maciçamente, sem retorno. Mas, não é de surpreender esta emigração - que vai agravar-se – dado que a Proposta do Orçamento de Estado consagra uma redução nível de protecção social e da despesa social de valores que é prematuro avaliarem-se agora. Esperemos o OGE….
Quando, pois, o CES afirma estarmos assistir a um processo doloroso, sem o ajustamento orçamental projectado, e por isso, talvez, inútil, poderemos pensar em diversas consequências, ou em diversas dores, destacando-se aqui a possibilidade de um agravamento da pobreza.
Sublinhe-se que a taxa de risco de pobreza da população empregada registou um aumento e era de 10,3 por cento já em 2010, que o risco daquela taxa para a população reformada era a 17,9 por cento em 2010, sendo que o risco de pobreza da população em situação de desemprego em 2010 foi de 36,0 por cento. Antes das actuais medidas e daquelas que aí vêm.
Aliás, e considerando apenas os rendimentos do trabalho, de capital e transferências privadas, 42,5 por cento da população residente em Portugal estaria em risco de pobreza em 2010. Realmente, os rendimentos provenientes de pensões de reforma e sobrevivência contribuíram em 2010 para um decréscimo de 17,2 p.p., observando-se uma taxa de risco de pobreza após pensões e antes de transferências sociais de 25,4.
Estes dados, lembraram-me Albert Thomas (que, foi, entre 1919-1932 o primeiro Director da OIT), quando, perante os dramas da Grande Depressão, disse em 1932 que "as questões económicas e sociais estão indissoluvelmente ligadas, e somente pode haver uma reconstrução económica sólida e duradoura se está basada na justiça social".
Na mesma linha mas, agora, há apenas uns meses, o último Director Geral da OIT, Juan Somavia, cujo mandato terminou recentemente, afirmava, com intencionalidade, perante o quadro actual da crise financeira de 2008 que é "hora… de prosseguir os objectivos de emprego, protecção social e direitos essenciais no trabalho com a mesma diligencia que os de controlo da inflação e do equilíbrio das finanças públicas. De este modo se obterão umas bases firmes para uma nova era de crescimento e justiça social." (in Trabalho, Revista da OIT, Dezembro de 2011).
É a história que não para e que, para alguns, se repete…
De facto, as preocupações do CES, os números da pobreza do nosso país, os 15,8 por cento de desempregados, jovens incluídos, os números de trezentos mil desempregados sem subsídio de desemprego, os números dos que trabalham com salários que ignoram quando e se recebem, os 65 mil jovens que, desde Junho do ano passado até Junho deste ano saíram do país, 44 mil dos quais no primeiro semestre, os números dos que procuram o acesso a medicamentos que já não compram, exprimem, oficialmente, entre nós, que ultrapassamos os limites da realidade e entramos no domínio do pesadelo social.
São os que clamam pelo seu salário, para citar São Tiago (5, 3-6) ….
É a hora da solidariedade, da proximidade, da vizinhança, das redes, do reforço da inovação social, sob pena de se exporem os "…trabalhadores ao risco de serem explorados pelas engrenagens da economia e pela busca desenfreada de produtividade" (in nº 279, do Compendio da Doutrina Social da Igreja). É esta uma linguagem que muitos não admitem, em nome de não se aceitarem alternativas ao pensamento único dominante, e até recusando soluções diferentes das que são ditadas pelo experimentalismo de meia dúzia de teóricos de laboratório, os quais fingem ignorar que, desse modo, contribuem para o risco de extremarem posições.
Depois …. Não se queixem…..



Autor
José Ayres de Sá

Categoria
Opinião

Palavras-Chave
social / risco / Estado / pobreza / CES / dor / Qualquer / país / Económico / processo

Entidades
Dr. Silva Peneda / Parecer / Albert Thomas / Juan Somavia / São Tiago

Artigo Preservado pelo Arquivo.pt
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