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A brincar também se aprende

2013-03-20

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Já não se pode ser cavalo por mais elegante, esperto, airoso, bem parecido e acomodado que seja.

Já só nos faltava esta, querem lá ver. A associação internacional dos cavalos e outros quadrúpedes reuniu num montado, enfeitado de palha, relva viçosa e fresquinha, situado não se sabe onde, para protestar e disferir uns coices e umas parelhas contra aqueles que não se cansam de fazer alarido por terem encontrado vestígios de carne de cavalo em hambúrgueres, almôndegas e demais carnes picadas, em exposição e venda nos habituais e credenciados mercados públicos. Os cavalos a pensarem que sua carne era o que de melhor e mais saboroso se poderia encontrar nos mercados, pois sempre primaram pela compostura física, pelo asseio em seu pêlo luzidio e atrativo, bastando olhar para a capacidade nos saltos em altura, malabarismos em desfiles de gala e no comportamento em confronto com toiros nas arenas e outros concursos, e verem-se agora fragilizados perante porcos, vacas e, se calhar até, perante alguns burros que por aí se pavoneiam à solta.
Se afinal para padronizar hambúrgueres e almôndegas qualquer porco com fama de sujo ou uma reles vaca dum raio serve, porque não se poderá aproveitar a chicha do esbelto cavalo, que nesta altura se vai sentindo marginalizado social e animalescamente. Já não se pode ser cavalo por mais elegante, esperto, airoso, bem parecido e acomodado que seja. Até depois de morto é subalternizado, quem diria.
Resta saber se a carne para esses compostos deverá ser "de" vaca ou "da" vaca ou "de" porco ou "da" porca. É caso que deverá merecer também uma séria investigação. Se as mais altas esferas nacionais não se entendem no que diz respeito ao mandato das presidências "de" câmara ou "da" câmara, mais que razão terão também os trabalhadores dos matadouros ou dos talhos para duvidarem se o hambúrguer, a almôndega ou a carne picada deverão ser "de" vaca ou "da" vaca, "de" porco ou "da" porca. Estamos metidos numa tripa ortográfica que nunca se sabe se dela não poderá resultar ainda numa salsichada à maneira, toda ela envolvida dos mais desaconselhados anti-inflamatórios gastronómicos.
Como as coisas às vezes se complicam, quando ainda nem sequer entrámos no campo das faturas que vão dando alguns lucros a construtores de máquinas registadoras e a fabricantes dos rolinhos de papel e tinta.
Isto é que vai por aí uma confusão a todos os níveis… Estamos mesmo pela hora da morte. O que nos vai valendo são as raspadinhas espalhadas por bares e quiosques. Essas, sim, vão tendo Misericórdia de nós e não precisam de fatura nem número de contribuinte. É sempre a aviar.
Que Grândola nos acuda mesmo entoada em sons desafinados.



Autor
Sérgio Gaspar Saraiva

Categoria
Opinião

Palavras-Chave
cavalo / vaca / carne / porco / cavalos / esperto / airoso / elegante / brincar / aprende

Entidades
subalternizado / fresquinha / Misericórdia / Grândola

Artigo Preservado pelo Arquivo.pt
→ Ver Original

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